domingo, 23 de março de 2014

Não falem (apenas) das flores!

Blog da igualdade.

Igualdade, isso sim, em tudo e todos os dias


 
No Dia 8 de março de 1857, operárias de uma fábrica de tecidos em Nova York (EUA) entraram em greve para reivindicar melhores condições de trabalho, como a redução na c arga diária para 10 horas (as fábricas exigiam 16 horas), a equiparação salarial com os homens (as mulheres chegavam a receber menos de um terço do salário deles, pelo mesmo ofício) e tratamento digno dentro da fábrica. A manifestação foi violentamente reprimida. As mulheres foram trancadas dentro da fábrica, que foi incendiada. Aproximadamente 130 tecelãs morreram carbonizadas. Somente no ano de 1910, durante uma conferência na Dinamarca, ficou decidido que o 8 de Março passaria a ser o “Dia Internacional da Mulher”, em homenagem às mulheres que morreram na fábrica. Em 1975, a data foi oficializada pela ONU (Organização das Nações Unidas).


Brasília, capital federal, às vésperas do Carnaval (cenas descritas em matéria publicada pelo Correio Braziliense , em 1º de março de 2014):

“Na hora em que a discussão começou, por volta da 1h, poucas pessoas estavam no estabelecimento, que tem sete anos e é bastante frequentado pelo público GLS. Dois casais de lésbicas sentavam próximo à porta. A poucos metros, havia uma mesa com seis pessoas, sendo três homens e três mulheres. Não se sabe ao certo por que a confusão entre os grupos começou, mas, durante a briga, uma das meninas foi xingada de ‘lepra da sociedade, puta, neguinha e sapatona’.
As agressões verbais evoluíram para agressões físicas. Daniela*, 18 anos, levou murros no rosto, chutes na cabeça e desmaiou. A namorada dela, Maria*, 21, tentou defendê-la e também acabou atacada. “As imagens não saem da minha cabeça. Já estou acostumada a agressões psicológicas pelo fato de ser lésbica, mas nunca imaginei passar por tanto terror”, contou Maria. “Foi uma violência gratuita”, reforçou Daniela.”

Depoimento: Em luto pela impunidade"

“Sinto-me violentada no meu espaço de trabalho. Não tinha nem vontade de abrir a loja depois de tudo o que aconteceu. O meu desejo era de manter o estabelecimento fechado em luto pela impunidade. Não é possível que essa violência seja considerada algo normal, que essas pessoas saiam impunes e que os agressores responsáveis por espancarem a jovem, detidos e encaminhados pelas mãos do poder público, sintam-se confortáveis para rir na nossa cara. Porque foi isso o que aconteceu. Mesmo com a polícia presente, continuavam a proferir termos agressivos com relação à sexualidade e à raça das vítimas. Mesmo após entrar na viatura, continuaram a proferir que elas eram uma doença e que eles tinham de matar todo mundo. Fomos à Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam) e continuaram provocando as vítimas, falando que bateriam na cara da ‘neguinha’. A pessoa não pode ser violentada por ser mulher, homossexual e negra. Gostaria de lembrar que o Balaio Café é um território de liberdade de expressão e diversidade sexual. E, pelo resultado que vi na delegacia, sei que não vai dar em nada. Vão registrar apenas como uma lesão corporal. Enquanto não tivermos uma legislação ou um decreto que combata a homofobia, a impunidade, infelizmente, persistirá.” Juliana Andrade Lima, 33 anos, dona do Balaio Café, em Brasília.

 
                                   Pintura que há muito decora a parede do Balaio Café


Neste 8 de Março, Dia Internacional da Mulher, continuamos sem ter muito a celebrar. Comemorar o quê, no Brasil ou em boa parte do mundo? É a mais pura hipocrisia social essa insistência em determinar um dia do ano para enviar flores e mensagens do tipo “mulher é forte”, multiuso, consegue fazer mil coisas ao mesmo tempo. É generosa, gentil e está sempre de bom humor, feliz... é super-heroína!

Isso tudo está mais para reforçar as imagens estereotipadas – os construtos engendrados nas culturas, religiões e tradições – de que se pode fazer de tudo para e com/contra elas. Pouco importam as políticas públicas e as leis mais recentes pela equidade de gênero, pelos direitos fundamentais, humanos e civis, das mulheres.

Afinal, como ditam a publicidade e a propaganda (e a imprensa, os filmes, os livros e todas artes – ficcionais ou não), praticamente em nível mundial, elas são “pau prá toda obra”, “incansáveis”. São verdadeiras escravas (inclusive, sexuais) e estão aí para servir. Ganham menos ou nada para fazer o mesmo trabalho que os homens; fazem virtualmente todo o “serviço” doméstico; e, com frequência, são cobradas ou até espancadas e mortas por não cumprirem seus “papéis”. Esperados delas após milênios de “domesticação” pelas tradições religiosas e culturais.

Bom, para surpresa de muitos e apesar de toda a pressão contra, a maioria das mulheres, mundo afora, não mais se limita a tais estereótipos. Os rejeita e luta contra tudo isso, já há muito, desde as primeiras ondas feministas do Século 19. Em nossa contemporaneidade, por não mais haver como negar a elas os acessos à informação, à educação e ao mercado de trabalho, as mulheres simplesmente já não se encaixam em mitologias que, na verdade, as diminuem e as restringem.

Elas não querem mais ser super donas-de-casa que também trabalham e “ajudam” nas despesas com a família. Reivindicam, com justiça, o compartilhamento equânime dessas jornadas duplas, ou triplas, de serviços domésticos, cuidados com as crianças e a labuta fora de casa. Tal sobrecarga apenas faz aumentar as atuais estatísticas sobre a deterioração da saúde feminina, pelo estresse físico e o esgotamento mental.

Ao passo que as mulheres caminham para a equidade no que tange o sustento próprio e o de seus filhos e filhas (no papel de “chefas de família”), no Brasil, as pesquisas mais recentes apontam que apenas daqui a 30 anos, ou mais, elas terão a tão sonhada igualdade salarial. Muito devido a um sistema patriarcal e machista, ainda forte a disseminar a falsa ideia de que os homens devem ganhar mais pelo mesmo trabalho, pelos mesmos cargos, em empresas públicas ou privadas. Simplesmente porque “sustentam” suas mulheres e a família. Oi?!

Qual é a consequência disso tudo? Um estranhamento cada vez mais perigoso, violento e abissal entre os gêneros. Felizes são, hoje, os homens e as mulheres que acordam para a equidade, para a serenidade em saberem que são iguais em seus direitos e deveres sociais, civis, econômicos e culturais. Uma antenada amiga enviou-me ontem o texto escrito no Blog Papo de Homem que acredito valer para o que coloco aqui:

“ Um homem . Ser homem. Homem não chora. Tem de ser cavalheiro. Tem que ter um trampo bom. Precisa de grana. Paga jantar. Compra as alianças. Dá presente. Cuida da mãe. Do pai. Dos irmãos. Prega prateleira. Usa furadeira. Arruma encanamento, vazamento e outros centos. Dá o lugar pra alguém sentar. Segura a onda. Fica em pé. Dirige. Troca óleo. Troca pneu. Resolve. Gosta de carro. De futebol. Respeita as mulheres. É bom de cama. Faz a barba. Vai direto ao ponto. Prefere não ter DR. Só casa se amarrado. Só casa com quem quiser. Paga pensão quando engravida. Paga pensão quando separa. Faz teste de DNA. Faz xixi em pé. Se você é homem, certamente já viveu pelo menos uma dessas situações – ou pressões – além de muitas outras. Nenhuma delas sozinha te faz homem , e o fato de ser homem não te faz corresponder exatamente a todos esses padrões. Certo? Pois dê-se muito feliz por poder não se encaixar em vários desses estereótipos masculinos nos dias de hoje, e agradeça eternamente ao feminismo por isso.” Feminismo é Papo de Homem? por Marília Moschkovich

Sim, o feminismo é papo de homens e de mulheres! É absurdo continuar com piadas e insultos contra movimentos que vêm libertando a todos e todas nas sociedades globais. Ações que fomentam não somente a igualdade entre os seres humanos – pelos direitos das diversidades raciais, étnicas, gerações (crianças, adolescentes, idosas e idosos), de orientação sexual e de gênero –, mas também maior compreensão, atenção e harmonia sociais. Sem pressões absurdas sobre uma ou outra pessoa.

Entretanto, o que temos presenciado mundo afora é uma resistência sobre-humana às mudanças, às transformações necessárias. É surreal e patético verificar o ressurgimento de ideologias nazistas e fascistas, de racismo, misoginia, machismo, homofobia e do ode às tradições de “família e propriedade”. Família “tradicional”, diga-se de passagem, com papai e mamãe a encenarem papéis arcaicos de “opressor e submissa/oprimida”. 


 

Qual é o balanço dessa dicotomia, ou esquizofrenia, entre as forças contemporâneas que já não admitem tais mitologias e as que insistem em retomá-las ou perpetuá-las?

Na Europa, a mais gritante consequência, e que já se verifica também por aqui, é a resistência das mulheres economicamente ativas e estáveis, quando chegam aos 40 ou 50 anos, em permanecerem casadas. Não mais admitem a sobrecarga da jornada dupla, indefinidamente. Preferem estar sozinhas – ou apenas com seus filhos e filhas, a dividir os deveres e prazeres do lar –, a seguir fazendo também o papel de mulher/amante gentil, que atende também às necessidades dos cônjuges/companheiros.

Não é sem motivos, hoje, o alto índice de homens de meia idade com dificuldades em encontrarem companheiras, tanto nos países desenvolvidos como também entre as classes mais abastadas das regiões em desenvolvimento. O casamento ou a união com mulheres das regiões mais pobres do planeta, como as da América do Sul ou da Ásia, tem sido a “solução” para muitos que ainda acreditam nos papéis vitorianos. Naqueles em que as mulheres lavam e passam suas roupas, cozinham, limpam o banheiro e ainda perfumam a casa...

Esse não é um modelo de felicidade. Muito longe disso. Até porque nem mesmo as pessoas “bem treinadas” para a submissão suportam tais sobrecargas por muito tempo. O desamor, o estresse e as brigas são o caminho mais certo. E aí...

Por aqui, mais do que nunca, houve o aumento desenfreado das múltiplas violências contra elas – assassinatos, estupros, espancamentos, tráfico humano (inclusive, de meninas/os), salários e oportunidades desiguais em relação aos homens, prostituição, e por aí vai.

Mesmo com as louváveis mudanças na legislação brasileira, como a que retirou o termo (conceito?) "mulher honesta" do Código Civil, e a aprovação, em 2006, da Lei Maria da Penha , os números dos assassinatos de mulheres chegam a um absurdo patamar de mais de 15 feminicídios diários , no país. Ou seja, uma morte violenta de mulheres a cada 1h30min.

Segundo os dados, já há três anos o Brasil ocupa a 7ª posição na listagem dos países com mais casos de feminicídios. Segundo querem fazer crer alguns pesquisadores, o aumento deve-se a um número cada vez maior de mulheres que se encorajam a denunciar casos de agressão. Será?

Um levantamento da OMS ( Organização Mundial da Saúde ) aponta para o fato de que 70% das vítimas de assassinato, do sexo feminino, foram mortas por seus (ex) parceiros. No Brasil, além dos elevados índices de feminicídios, a cada 15 segundos uma mulher é espancada e, no mesmo intervalo de tempo, ocorre um caso de estupro contra elas.

Em nível internacional, foi divulgado essa semana o estudo contundente da Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia, com a estatística de que uma em cada três mulheres da UE foi vítima de violência física ou sexual. Ou seja, algo em torno de 62 milhões de mulheres residentes na Europa sofrem ou já passaram por algum tipo de violência machista. Uma em cada cinco (22%) disse ter sofrido essa violência por parte do parceiro ou ex-parceiro.

maior estudo sobre violência de gênero já realizado na UE envolveu 42 mil entrevistadas, nos 28 Estados-membros, ou 1,5 mil por cada país. As mulheres foram questionadas sobre as suas experiências de abusos físicos, sexuais e psicológicos, em casa, no trabalho, na esfera pública e também no espaço virtual (perseguição e assédio pela Internet).

Então, está na hora de se pensar, refletir e debater sobre políticas públicas realmente eficazes contra a discriminação e o preconceito – social, econômico, cultural e sexista/machista – contra as mulheres, no Brasil e em boa parte do mundo. Sobretudo, é preciso investir na educação igualitária, naquela que ensina o respeito e a equidade entre todos os seres humanos. A educação pela cidadania. E que esse ensino de qualidade bem como os recursos orçamentários para tanto estejam ao alcance de nossas mentes e corações em todas as regiões!

(Leia aqui no Blog o artigo da pesquisadora Cynthia Mara Miranda sobre a necessidade de regionalizar e interiorizar (melhores) políticas públicas, recursos orçamentários e as ações pela Igualdade/Equidade entre os gêneros)


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Sobre esta Blogueira:

Sandra Machado é jornalista e professora universitária. Doutora em História – com pesquisa em Estudos de Gênero, das Mulheres, Cinema, Multiculturalismo e Transnacionalismo, pela Universidade de Brasília (UnB). É Master of Arts em Cinema e Video pela The American University, Washington, D.C, EUA. Repórter e produtora para mídias audiovisuais e impressas - Correio Braziliense, Jornal do Brasil, TV Globo e o Caderno de Livros de O Globo. Sua tese de doutorado está em processo de edição em livro, intitulado Câmera Clara - Tela Obscura: Estereótipos Femininos e Questões de Gênero nos Cinemas. 

Sábado, 08 de março de 2014 07:00 am

Internalizar, interiorizar e regionalizar!

Mais e melhores políticas públicas para as mulheres


Por Cynthia Mara Miranda* 



 
Nota do Blog: Neste 8 de Março, Dia Internacional da Mulher – do combate às injustiças, violências e discriminações contra elas –, está na hora de se pensar, refletir e debater sobre políticas públicas realmente eficazes contra o preconceito – social, econômico, cultural e sexista/machista – contra as mulheres, no Brasil e em boa parte do mundo. O texto da professora e pesquisadora Cynthia Mara Miranda reflete sobre a necessidade de maior visão e conhecimento sobre as especificidades regionais, em um país de proporções continentais como o Brasil, para tornar eficaz toda e qualquer política pública que vise melhorar as condições e a qualidade de vida das mulheres brasileiras. No Norte, no Centro-Oeste, no Nordeste, ou no eixo Sul-Sudeste. Boa leitura e que as lutas feministas frutifiquem, mais e mais, todos os dias!



As mulheres das diversas regiões brasileiras têm buscado acessar os diferentes componentes do desenvolvimento – saúde, educação, oportunidades econômicas, direitos e participação política –, em dinâmicas plurais que as coloquem como agentes ativas de mudanças. Percebe-se, no entanto, que o acesso não tem ocorrido da mesma maneira para todas. E a carência, ou a falta de oportunidades, para elas é uma reflexão necessária neste Dia Internacional da Mulher.

É fato a diferença na qualidade de vida para as mulheres que vivem nas regiões Sul e Sudeste do país. Elas têm sido mais exitosas na busca de condições melhores, ao passo que aquelas residentes na região Norte têm enfrentado mais obstáculos para conseguir o acesso à educação, ao trabalho, ou aos serviços públicos de modo geral.

Embora a desigualdade entre os gêneros no Brasil tenha sido reduzida nos últimos 10 anos, graças ao compromisso do governo com a integração das políticas para as mulheres, tais ações estão distantes de atender, de forma mais ampla, toda a diversidade de seu público alvo. Por várias razões, entre elas, as desigualdades regionais. Avançar na interiorização das políticas públicas para as mulheres requer considerar o desenvolvimento regional como aliado da igualdade.

E o desenvolvimento regional na perspectiva de gênero é um tema recente que começa a consolidar-se como um eminente campo de estudos, que atrai a atenção de pesquisadoras de universidades distantes dos grandes centros de ensino e pesquisa do eixo sul-sudeste. É o caso das universidades federais do Amazonas, do Pará e do Tocantins.

O governo federal realizou, em 2013, a I Conferência Nacional de Desenvolvimento Regional, com o objetivo de formular princípios e diretrizes para uma nova política regional brasileira. No relatório final da conferência, que resultou em 21 propostas prioritárias, apenas duas fazem referência indireta às questões de gênero: no que diz respeito à valorização dessa diversidade, dentre outras, como as gerações, as etnias e as raças.

A principal proposta, que trataria do desenvolvimento regional na perspectiva de gênero – Respeito às diversidades regionais e de gênero –, ficou fora da lista de das 21 em destaque, por baixa votação. Ela estabeleceria critérios para a distribuição de recursos que fortaleçam as regiões com menor índice de desenvolvimento e a equidade de gênero. Assim, incentivaria a organização produtiva das mulheres e tornaria as políticas públicas mais acessíveis.

No que se refere às 95 diretrizes, somente duas destacam as questões de gênero. São elas: assegurar a participação das populações historicamente excluídas (mulheres, crianças/adolescentes, idosos e os povos e as comunidades tradicionais) nas políticas de desenvolvimento e adotar mecanismos de redução das desigualdades regionais e intrarregionais, considerando as dimensões ambientais, culturais, econômicas, sociais, de gênero e étnico-racial. “Dado que mesmo nas regiões mais ricas existe má distribuição de renda”, afirma o documento.

Como é possível notar, a temática ainda enfrenta obstáculos para ser pautada no âmbito governamental. O enfoque do gênero no desenvolvimento busca satisfazer as necessidades das mulheres, partindo de uma análise das relações nas comunidades e instituições que questionam o modelo de desenvolvimento dominante. E propõe uma alternativa de desenvolvimento humano e sustentável aliado à busca da igualdade entre os gêneros.

Os movimentos de mulheres da região Norte questionam o tipo de desenvolvimento preconizado pelas grandes obras que priorizam o agronegócio, as usinas hidrelétricas e a extração de minérios. Na região do Bico do Papagaio (extremo norte do Tocantins), conhecida no passado por intensos conflitos rurais e pela pobreza que ainda persiste nos dias atuais, os babaçuais que servem de fonte de renda para as quebradeiras de coco têm perdido espaço para os pastos, as plantações de soja e de madeiras nobres para empresas transnacionais instaladas na região.

Esse tipo de desenvolvimento “vendido para a população” não dá prioridade ao desenvolvimento humano. Consequentemente, tampouco às mulheres, uma vez que elas não são as maiores beneficiadas pelas vagas de emprego geradas pelas obras. Além disso, à margem de tais empreendimentos, tem sido recorrente o aumento da prostituição feminina.

Os referidos problemas poderiam ser combatidos com políticas de desenvolvimento regional que valorizassem o papel das mulheres nos municípios e, claro, com a criação de Organismos de Políticas para as Mulheres (OPMs). Esses ainda estão distantes da realidade do norte do país, já que a maioria se concentra nas capitais que são sedes dos governos estaduais. Poucos são os municípios que apresentam tais organismos em sua estrutura.

Quando abordamos as políticas públicas para as mulheres, nos referimos especificamente às políticas que possibilitam romper com a desigualdade entre os gêneros. A ação governamental com foco nas mulheres, mas sem a perspectiva das relações de gênero, reforça a responsabilidade da mulher na reprodução social (educação das crianças, cuidados com idosos/as e serviços domésticos). Ou seja, está voltada para a manutenção da família e não para a autonomia das mulheres.

Iniciativas de políticas estaduais e municipais que rompam com as desigualdades são raras na região Norte. Quando existem, geralmente estão associadas às políticas do governo federal. A capital do Tocantins, Palmas, destaca-se por uma experiência inovadora para a região. Desde 2013, a prefeitura criou, em caráter experimental, uma creche noturna ligada à Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social.

A creche abre oportunidades para as mães estudarem e/ou trabalharem no período da noite. Existe serviço gratuito e de qualidade para cuidar das crianças, que atende aquelas mulheres que não contam com outras pessoas para tomar conta de seus filhos e filhas. A demanda é crescente e já há planos para a criação de mais uma unidade noturna.

O fato de a região Norte ser uma das que mais carece de investimentos do governo federal impõe obstáculos ao acesso das mulheres aos serviços públicos. Elas enfrentam cotidianamente problemas advindos da feminização da pobreza, dos precários postos de trabalho, da sub-representação nos cargos de decisão e dos altos índices das violências às quais estão expostas. Além de lidar com diversas intempéries sociais oriundas do isolamento, dos conflitos de terra, das condições insatisfatórias dos serviços de saúde, do acesso limitado à qualificação ou das elevadas taxas de desemprego.

Entre os 10 estados brasileiros com maior taxa de homicídio feminino, o Pará ocupa a 5ª posição (Mapa da Violência – Homicídios de Mulheres, do Instituto Sangari, 2012). No que se refere aos convênios celebrados pela Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM/PR) na Ação - Enfrentamento da Violência Contra a Mulher por região, no período de 2003 a 2012, nota-se que 9,85% deles foram firmados para a região Centro-Oeste; 15,09% para a Norte; 30,06% para o Nordeste; e 26,30% Região Sudeste. Os dados estão no relatório final da CPMI da Situação da Violência contra a Mulher no Brasil (2013).

A região Norte concentra o maior percentual de mulheres sem rendimentos: 32,1%, segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (2012). Já na região Sul o percentual cai para 25,3%. E é de 28,7% no Sudeste. O rendimento médio das mulheres brasileiras que compõem a população economicamente ativa é de apenas R$ 904, na região Norte, enquanto o das mulheres da região Sudeste é de R$1.307, sendo esta a melhor média nacional (PNAD, 2012).


 
                                                       Cartaz do primeiro Simpósio promovido pelo NEDIG/UFT


Não é possível reduzir a desigualdade entre os gêneros sem considerar as especificidades regionais, bem como a necessidade de investimentos dos governos estaduais e municipais na pauta das mulheres. Tampouco é viável a dependência única e exclusiva de recursos do governo federal.

Alavancar o desenvolvimento regional implica reconhecer que as mulheres têm um papel fundamental nesse processo. Assim, resta aos movimentos das mulheres, diante da escassez de OPMs, continuarem atuando para que oportunidades políticas sejam criadas, assim como a abertura do diálogo com o estado possa ser traduzido em mais orçamento para as suas demandas nos planos plurianuais. Isso, consequentemente, fortalecerá as políticas para as mulheres e reduzirá as desigualdades de gênero, especialmente, nas regiões fora do eixo Sul-Sudeste. 



*Cynthia Mara Miranda é doutora em Ciências Sociais pela Universidade de Brasília (UnB) e professora do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional e do curso de Comunicação Social da Universidade Federal do Tocantins (UFT). É pesquisadora do Núcleo de Estudos das Diferenças de Gênero (NEDiG)/UFT. Integrou o Grupo de Trabalho sobre Jovens Mulheres, na Secretaria Nacional da Juventude da Presidência da República, entre 2011 e 2013. É membro da Câmara Técnica Estadual de Gestão e Monitoramento do Pacto de Enfrentamento da Violência contra a Mulher e conselheira municipal dos Direitos da Mulher, em Palmas.

Domingo, 23 de fevereiro de 2014 08:30 am

Entre tapas e beijos, sem arte

Nossa indústria cultural nunca esteve tão mal!


 
Uma breve análise de imagem basta para definir o que foi este “primeiro beijo gay” na TV Globo: higiênico, sem troca de fluidos, sem paixão. Uma concessão aos LGBT (bem) enquadrados nos papéis que seriam heteronormativos, do casamento comportado, com filhos/as. A diretoria global concluiu que o beijo traria mais audiência e pontos com o público.


Quando os retrocessos dos processos históricos chegam, vêm em várias ondas. Na contemporaneidade globalizada, há esse lamentável revival nos contra-movimentos que resgatam improváveis ideologias vintage . Essas são pretensamente inocentes e cheias de “boa vontade” em trazer de volta um irreal mundo florido, pleno em belezas, com tudo em seu “devido lugar”.

Bom, depende sob qual ponto-de-vista, ou background sociocultural, pensamos em “perfeição” ou em felicidade e qualidade de vida para uns, em detrimento daquelas que seriam as liberdades e equidade para (muitos) Outros. (Leia artigo do Blog sobre Stuart Hall)

Somos, no mínimo, cúmplices do resgate de valores socioculturais arcaicos, baseados nos (pre)conceitos patriarcais que, na verdade, deveriam estar bem enterrados. Pois, foi nesse sistema perverso que o racismo, a misoginia, o machismo, a homofobia e as demais formas de discriminação e de dominação tornaram-se ideologias que legitimam as desigualdades, as violências e as injustiças sociais, ao longo de séculos. Aqui e em qualquer lugar do mundo.

Hoje, com o acesso à informação e aos saberes, por diversas fontes e meios, torna-se impossível ignorar tais realidades e suas mórbidas estatísticas. Assim como é difícil não atentar para o fato de que são essas desigualdades que travam, atrasam ou estagnam as melhorias e os desenvolvimentos sociais de tantos países, regiões ou continentes.

Que o digam as pesquisas e estudos divulgados, anualmente, pela ONU e seus organismos, ou pelas ONGs internacionais que tratam dos índices de desenvolvimento humano, do trabalho, do comércio, ou das ameaças e transgressões às liberdades individuais e coletivas, em nível global.

A questão dos desequilíbrios econômicos, causados pela desigualdade e pelo desrespeito aos direitos das mulheres e das diversidades, é tão séria que será tema do próximo Fórum Anual Progressive Economy (projeto do S&D Group), no Parlamento Europeu, em Bruxelas, no início de março. A proposta do Fórum, aberto ao público, é informar amplamente sobre as políticas econômicaseuropeias, nacionais e globais, sobre a temática Desigualdade: Consequênciaspara a Sociedade , para a Política e para as Pessoas .


 
O principal debatedor do Fórum será o professor da Columbia University, Joseph Stiglitz, ganhador do Prêmio Nobel de Economia . Além de outros acadêmicos, o economista estará acompanhado por Martin Schulz, presidente do Parlamento Europeu Jörg Asmussen , secretário do Emprego e Assuntos Sociais da Alemanha; Jutta Urpilainen ministro das Finanças da Finlândia.

Paradoxalmente, à medida que tais desigualdades são reduzidas em algumas regiões, mesmo que em pequena escala, acabam por entrar em choque e mesmo em colapso devido aos que insistem em manter um status quo imaginário, construído a ferro e a fogo. Por meio da crença em uma suposta supremacia, incoerente e inexistente, de um grupo social sobre vários outros.

São os movimentos que se manifestam por atos explicitamente violentos, tanto fisicamente quanto moralmente, pela desqualificação sistemática – piadas, chacotas, pancadaria e discursos inflamados – contra os agentes que lutam pelas transformações culturais, sociais, políticas e econômicas de uma comunidade, de uma nação ou de todo um continente.

Essas violências ocorreram, historicamente, contra todas as ondas dos movimentos feministas, desde o vitoriano e conservador século 19 –   um período de trevas tal qual a Idade Média; também contra os que lutaram pelos direitos civis dos negros (afrodescendentes e outras raças e etnias), desde a Guerra Civil norte-americana, naquele mesmo século, até os dias atuais; ou ainda contra os ativistas pelos direitos humanos e civis dos LGBT.

Hoje, acima de tudo com as graves questões das explorações (escravidão) laboral e sexual, temos ainda que intensificar as ações e as leis pelos direitos da infância e da juventude. Sem esquecer da outra ponta, de idosos e idosas, que são igualmente explorados, relegados às margens sociais e desrespeitados em seus mais fundamentais direitos humanos, previdenciários e de saúde.

Entretanto, a realidade brasileira e de tantos outros países, nos últimos 15 ou 20 anos, no âmbito desse patético resgate vintage, é que não basta o aumento explosivo e inquietante das múltiplas violências machistas, homo/lesbo/transfóbicas ou racistas – e os das explorações de menores e de idosos/as. Estamos em um limbo em que, assustadoramente, voltamos aos tempos escravocratas (e pós) da pigmentocracia.

O que é isso? Ora, são os 50 tons de cinza... as cores de pele (humana), seus níveis de melanina – na escala entre o branco (de neve!), passando pelo amarelo (orientais), pelo marrom (indígenas) e o negro (puro!) – onde o indicador favorável pende para as sociedades, ou nações, mais brancas.

São regimes de poder socio-estatais onde as representações sociais são engendradas de forma a naturalizar crenças “alvejantes” dos que se acreditam superiores, em todos os níveis. Isso enquanto a maioria populacional está bem longe de corresponder ao padrão Wasp eurocêntrico: brancos, arianos/anglo-saxônicos e cristãos (protestantes).

Os Wasp não são parte de qualquer grupo social (patriarcal) de homens (mais) brancos. E digo homens mesmo, do gênero masculino, o referencial transcendente, onipresente e onipotente. As mulheres são sempre, nesse esquema, cidadãs de segunda classe. Ou nem isso.

No que tange o conceito de colônias escravocratas, os Wasp representam, principalmente, os cidadãos nascidos nos Estados Unidos, de ascendência britânica (anglo-saxônica), que detêm, ainda em nossa contemporaneidade pós-colonial, um imenso poderio econômico, político e social. Logicamente, são parte daquela meia dúzia que é dona do mundo.

O resto – nações em desenvolvimento ou subdesenvolvidas – é piada de mau gosto, que reverbera planeta afora, ao tentar reproduzir os mesmos padrões, em e por meio de indústrias culturais/midiáticas absolutamente miméticas de suas principais matrizes norte-americanas e (norte) européias.

Como decorrência desses códigos martelados e perpetuados nas “colônias”, presenciamos casos como o que ocorreu no Peru, semana passada, nos atos de racismo praticados pela torcida do Real Garcilaso, em jogo contra o Cruzeiro, válido pela Copa Libertadores. Sempre que o jogador brasileiro Tinga, que é negro, tocava na bola, a torcida peruana fazia sons imitando macacos.

 

Tinga não foi o primeiro jogador vítima de racismo, nas últimas duas décadas. E não será o último, pelo andar da carruagem. Desde que a globalização chegou aos esportes – e detonou o agora intenso comércio de atletas, em várias modalidades –, as manifestações de ódio e insatisfação das torcidas voltaram-se para o lado ideológico da tal pigmentocracia. Já vimos cenas como as da torcida peruana também aqui no Brasil, na Argentina, na Rússia, na Itália, na Espanha... e com direito a bananas atiradas nos campos!

É a retomada indigesta daqueles valores que parecem ter sido enterrados vivos e que agora retornam como zumbis a nos assombrar com seus mórbidos tons de cinza. Mortos-vivos vitorianos e sádicos, que já foram resgatados pelo nazi-fascismo, pelas ditaduras várias do século XX e, agora, sob disfarces nostálgicos de “saudosistas” neo-vitorianos.

São os que querem voltar a fazer piqueniques familiares – papai, mamãe e criancinhas – em parques urbanos ou nas praias de Ipanema e do Leblon... Tudo pretensamente bonitinho, arrumadinho, seguro e, de preferência, branquinho(s).

Que outra explicação teríamos para tais demonstrações de ódio e preconceitos raciais (ou machistas ou homofóbicas) entre as populações extremamente miscigenadas, ou as chamadas não-brancas? E incluo aí todas as discriminações e exclusões porque, claramente, estão intimamente de mãos dadas! Quem se roga o direito de ser racista, até pela ignorância – falta de conhecimento e razoabilidade –, será também machista, sexista...

Passar um dia inteiro ao sol, em um parque ou na praia, é bom demais. Entretanto, seria melhor ainda se todas e todos, não importa de que raça, orientação sexual, gênero ou idade, pudessem estar ali também, livremente e com qualidade, sem medo de ataques, assédios ou assaltos. Ou estupros ou mortes. Civilizadamente, no convívio entre as diferenças. Homogeneização e sanitarismo de classes, raças, gêneros, ou comportamentos, rimam com as piores formas de dominação, vileza e mediocridade humanas.

São belos os dias ao sol em lugares, regiões ou países, onde a educação e o respeito às diversidades já fazem parte do cotidiano. Nesses pequenos paraísos terrestres, pode-se testemunhar o que a boa educação inclusiva realmente pode fazer pela prática da liberdade – para lembrar o mestre Paulo Freire. Incluindo o saber que, de fato, a liberdade individual é bem mais afinada quando se respeita o espaço e o tempo do Outro.

Em um país extremamente violento com suas “minorias”, como é o Brasil, os produtores e fomentadores da cultura de massa têm o dever, a obrigação mesmo, de pensar muito no que andam reproduzindo, ou mimetizando, nas mídias – ficcionais (entretenimento) ou noticiosas (não ficcionais).


 

Querem estatísticas para tomar consciência de o quanto têm colaborado com o caos das múltiplas violências? Basta saber que nosso país está em primeiríssimo lugar mundial nos assassinatos contra os LGBT, com pelo menos uma ocorrência (registrada) por dia. E é hoje o quarto mais violento contra as mulheres, com mais de 15 feminicídios diários (uma mulher é assassinada brutalmente – em crimes passionais – a cada 1h30min). Isso sem contar que a violência de gênero (inclui os LGBT) também estupra, abusa, ameaça e torna as vítimas socialmente incapazes.

Segundo dados estatísticos e notas técnicas, recém-divulgados pelo PEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), ao considerar apenas o universo dos indivíduos que sofreram morte violenta no país, entre 1996 e 2010, constatou-se que, para além das características socioeconômicas – como escolaridade, gênero, idade e estado civil –, a cor da pele da vítima, quando preta ou parda, faz aumentar a probabilidade de o mesmo ser vitima de homicídio em cerca de oito pontos percentuais.

“O negro é duplamente discriminado no Brasil, por sua situação socioeconômica e por sua cor de pele. Tais discriminações combinadas podem explicar a maior prevalência de homicídios de negros vis-à-vis o resto da população”, afirma a nota do Ipea. Os negros representam 48,2% dos trabalhadores nas regiões metropolitanas. No entanto, a média salarial deles chega a ser 36,1% menor do que a de não-negros.


 
Estudantes do curso de Jornalismo da Universidade Católica de Pernambuco (Unicap) fotografam o movimento Um Bilhão que se Ergue , pelo fim da violência contra mulheres e meninas, em Recife.

Novelas: estereótipos e violências

Não há mais espaço para fazer espetáculos circenses com beijos, comportamentos e relacionamentos entre os LGBT, como ocorreu, por exemplo, na última novela das 9, da TV Globo. Nela, os três personagens gays parecem saídos de um conto de fadas da Disney. A “bicha burra, mas meiga”; o “advogado do diabo” que não assume a própria sexualidade, mas se redime no fim; e a “bicha má” que vira princesa e resgata todo mundo na trama. Inclusive, o pai ultra mau caráter, conservador e machista.  

Na higiênica homossexualidade globete, não existem (ou não são vistos) gays (ou lésbicas ou bi/transexuais) que sejam gente como todas e todos na face da terra. Que transem e curtam por aí com quem bem entendem. Que frequentem qualquer lugar (inclusive as saunas e boates “devassas”) e que se beijem e façam carinhos fora do “casamento” bonitinho, armado no fim para o personagem Felix. Senhor Walcyr Carrasco, bata-me um abacate! Ou vá viver e escrever na Disneylândia.

Aliás, essa foi uma novela (como tantas outras) que promoveu os mais perversos estereótipos que funcionam contra as mulheres. Nela, nenhuma personagem feminina é minimamente “saudável”. Nem mesmo a certinha Paloma, uma santa que arrisca a própria vida para ser “mãe” e para satisfazer o seu macho. Ou para resgatar o pai grosseiro que também a maltrata e manipula no enredo.

As outras mulheres? Todas vagabundas, interesseiras, assassinas, infiéis... Em suma, os tradicionais estereótipos: bruxas, malvadas/manipuladoras, femmes fatales que, em algum momento, destruirão “o homem”. Quanta misoginia! O Carrasco, homossexual, encaixou-se como luva em outro perverso construto cultural: o de que os gays odeiam as mulheres.

E os negros? Os indígenas? Ah, esses são marcados pela invisibilidade. Nem aparecem nessas produções. Quando estão lá, continuam (mal) representados como empregadas(os) domésticas(os), enfermeiras/os, faveladas/os, enfim, seres marginais, da “periferia”, servis às classes branquinhas (escala pigmentocrática) mais abastadas. Vide os personagens negros ou pardos que estão, agora, na novela Em Família.

Não me venham com essa de que “é assim na vida real”! Que arte e a vida se imitam. Não, não é assim. É, sim, o que querem fazer acreditar, no mundo do faz-de-conta. O papel da arte (e do foco nos casos de produções documentais) é justamente o de transformar. O de alertar, acordar e mudar. Jamais o de meramente reproduzir construtos socioculturais para perpetuá-los.

Há muito, os negros ou não-brancos (imigrantes), as feministas e os LGBT demandam a reviravolta conceitual e ideológica nas indústrias culturais norte-americanas e européias. Tudo para que as representações sociais sejam, primeiramente, pela visibilidade de seus costumes, hábitos e comportamentos sociais e culturais. Não apenas os “reais” mas de forma dinâmica e afirmativa. Para que façam parte de escolas e universidades, visualizem possibilidades outras de vida e galguem melhores posições na pirâmide social.

O festival misógino, machista, racista e homofóbico é mesmo marca registrada das produções audiovisuais brasileiras, pouco importa quem as roteirize, produza e dirija. Os “autores/as” gays, mulheres ou miscigenados espantam por funcionarem como peças ventríloquas no esquema industrial. Talvez por serem tão despreparados e rasos. Talvez porque não querem perder dinheiro e status quo.Ou, pior, são mesmo fruto e ativos repassadores/as dos códigos culturais que tanto queremos mudar.

Os exemplos das duas últimas novelas, Amor à Vida e a atual Em Família , chegam a provocar náuseas em qualquer pessoa mais atenta, mais conectada às reais necessidades contemporâneas.

Quando será que, em qualquer praia ou parque do Brasil, não mais ouviremos piadas machistas e/ou ameaças às mulheres que tiram suas blusas, ou sutiãs, para tomar sol? Não teriam elas o mesmo direito que eles? São vadias ou vagabundas? Até quando as brasileiras terão que fazer os papéis estereotipados de boas mães (reprodutoras) ou avós? Terão sempre que aparecer na fita como mulheres silenciosas e recatadas?

Ou quando será que os gays (LGBTI) poderão se beijar ao sol, sem necessitarem do aval sanitário das absurdas novelas, filmes e telejornais globetes? Por “globetes” defino não apenas as organizações Globo, mas todas as demais empresas de entretenimento e de notícias no Brasil. Não dão um passo sem antes consultar o que foi feito ou está em alta na matriz...

Quando será que veremos pardos, negros, índios ou imigrantes (médio) orientais serem representados como seres humanos, homens e mulheres, que estudam e trabalham para e por vidas confortáveis, amorosas e dignas? Sem a pecha de marginais, favelados, violentos, exóticos excêntricos, terroristas (caso do palestino de Amor à Vida , um matador de criancinhas).

Isso porque, segundo nossas indústrias culturais – aquelas satélites do eurocentrismo, que mimetizam aliás o pior lixo que nos é exportado –, os estereótipos perpetuados, por exemplo, para as mulheres são esses, não é? Senão são santas como vacas mansas, leiteiras e reprodutoras, são mulheres “secas”, mal amadas, bruxas e malvadas. Vadias a vaguear por aí, à caça de homens que as sustentem e escravizem (um ao outro). Até que sejam mortas e/ou descartadas por seus machos, para que a fila ande.

Aterrador. Não há como não associar isso tudo à violência de gênero que grassa e faz com que o Brasil figure, há décadas, entre os que mais assassinam mulheres em todo o mundo. Note-se que elas representam mais de 50% da população mundial. Todavia, ainda temos que suportar esses papéis sendo martelados nas novelas, filmes e teatros brasileiros, diuturnamente.

Em suma, nossa rica “dramaturgia” é mesmo um poço de deseducação e desserviço a toda a sociedade. Raramente, ou nunca, há personagens femininas (ou das “minorias”) bem-sucedidas, que trabalham, estudam e vivem bem, casadas ou solteiras. Tendo procriado ou não. Aliás, raramente há personagens femininas bem trabalhadas na dramaturgia. São quase sempre estepes, panos de fundo, para enredos essencialmente masculinos.

Outro dia, ouvi de uma amiga que ela estava com medo de “passar do tempo” de ser mãe. O seu “relógio biológico” já estaria disparando o alarme fazia algum tempo. Deve ser a centésima vez que escuto isso de alguma conhecida, amiga ou parente. Mas, o quê ou quem determina qual é a hora ou o tempo de uma mulher engravidar? Que mito é esse de “relógio biológico”?

Há milênios, as mulheres engravidam quando fazem sexo, em qualquer tempo e enquanto forem “férteis”, ou porque querem ou porque não tiveram acesso à educação sexual ou aos contraceptivos. Nem vou entrar no debate de que os homens também são responsáveis pela gravidez. 

Entretanto, em nossa contemporaneidade vintage , que segue os ditames de meia dúzia de “dramaturgos globais”, as mulheres adquiriram o tal relógio biológico que dispara se elas chegam aos 35 anos sem engravidar. Pior, ditam que elas têm que ser mães, mesmo que tardiamente, nem que isso as mate ou inviabilize suas vidas.

Sobretudo, devem ser mães mesmo que não queiram, que não tenham vocação ou que não gostem da idéia de serem responsáveis por alguém pelo resto de suas vidas. Sim, porque em países como o Brasil, os homens não são co-responsáveis pela criação das crianças. Não são cobrados nem xingados por isso, quando as abandonam ou nem as registram. O dever é da mãe/mulher. (Leia artigo e estatísticas aqui no Blog)

 
Acusado de espancar até a morte o próprio filho, de apenas 8 anos, Alex André Moraes Soeiro, 34, foi preso na terça-feira passada por policiais da 34ª DP (em Bangu, no Rio de Janeiro). A Justiça decretou mandado de pr isão temporária de 30 dias por homicídio qualificado.


O fato é que a maternidade compulsória de nossos tempos está a por no mundo seres humanos que serão (mal) criados e (mal) educados por outros seres humanos que não deveriam ou não poderiam ser pais ou mães. A pergunta é se alguém que posterga o quanto pode, ou mesmo que sabota, quer mesmo ser mãe e/ou assumir uma relação (a maternidade) que durará pela vida afora. Não é provável. Por quê, então, cobrar-se pelo alarme do relógio imaginário, senão pela obrigação social que vem sendo engendrada por uma cultura de massa irresponsável e caça-níquel?

As crianças abandonadas, prostituídas, exploradas em trabalhos impróprios e criadas fora da escola, ou sem os devidos cuidados e amor, deveriam tornar-se encargo financeiro dos “autores” de novelas e filmes. Ou dos religiosos que agora pregam também nas TVs, rádios e redes sociais (internet), país afora. 

O mesmo deveria ser sentenciado para que arquem com as despesas dos LGBT, das mulheres ou das “minorias” raciais e étnicas, após serem espancados, estuprados, abusados, vilipendiados ou expropriados de seus futuros – escolas, bens, terras, propriedades (físicas e intelectuais).

 
O deputado Luís Carlos Heinze (PP-RS) afirmou que índios, quilombolas, gays, lésbicas e travestis são “tudo o que não presta”. 
Não é ridícula a pigmentocracia em sociedades não-brancas de tantos países, regiões ou continentes? Apenas para tornar mais robusta a teoria de que os preconceitos patriarcais englobam todas as diversidades, acrescento aqui o movimento de ativistas do Greenpeace, sobre um fato ocorrido com parlamentares do Rio Grande do Sul. 

Na última semana, foi divulgado pela Mobilização Nacional Indígena um vídeo que mostra parlamentares da bancada ruralista gaúcha protagonizando mais uma cena de afronta pública aos direitos indígenas e os das outras minorias.

Nas imagens, gravadas durante uma audiência, os deputados Luís Carlos Heinze (PP-RS) e Alceu Moreira (PMDB-RS) não só incitam a violência contra lideranças indígenas – as que tentam retomar suas terras invadidas por fazendeiros, grileiros e madeireiros –, como também insultam outras populações tradicionais do Brasil e ainda os LGBT.
Os parlamentares referem-se a índios, quilombolas, gays, lésbicas e transgêneros como “tudo o que não presta”, e estimulam agricultores a usarem de segurança armada para expulsar indígenas do que consideram serem suas terras. Esses políticos contam, desde sempre, com a ajudinha amiga da nossa branquíssima indústria de entretenimento – ficcional ou não. Um desastre que torna utópica a noção de igualdade ou de direitos humanos e civis por aqui.


 
Agora dá para comparar o que é a HQ da francesa Julie Maroh e o quanto o filme Azul é a Cor Mais Quente (La Vie d’Adèle, França, 2013), escrito e dirigido por Abdelatif Kechiche, tem outros códigos, bastante machistas A Martins Fontes lançou os quadrinhos em português! Escrevi sobre o filme, inclusive sobre o que Julie Maroh pensa sobre o roteiro da película, aqui no Blog:http://www.dzai.com.br/igualdade/blog/blogdaigualdade?tv_pos_id=143949 


Links relacionados:

Definição de Wasp:


Deputado diz que quilombolas, índios e homossexuais são “tudo o que não presta” e incita violência contra as minorias:

    
Debate sobre mídia e responsabilidade social, ética e democracia participativa no TED Talks, com David Puttnam. Ele é educador e cineasta britânico, além de atuar na política (partido trabalhista inglês):


Notas sobre Violência de Gênero e Escravidão)


São 250 milhões de crianças sem futuro no mundo
E mais de 200 milhões de meninas "desaparecidas"/assassinadas) 


Devaneios sobre garis e Igualdade
... nas faixas, nos rótulos e na lixeira)

(Ipea: Lei Maria da Penha não consegue reduzir homicídios de mulheres)

(Mais de 15 mulheres morrem de forma violenta no Brasil, diariamente)

Média salarial dos negros é 36% menor, aponta pesquisa do Dieese


Estupros superam casos de assassinatos, diz Segurança Pública


Mulheres violentadas sofrem com o trauma e com a falta de assistência


O Globo: Guerra contra as Mulheres



Sobre esta Blogueira:

Sandra Machado é jornalista e professora universitária. Doutora em História – com pesquisa em Estudos de Gênero, das Mulheres, Cinema, Multiculturalismo e Transnacionalismo, pela Universidade de Brasília (UnB). É Master of Arts em Cinema e Video pela The American University, Washington, D.C, EUA. Repórter e produtora para mídias audiovisuais e impressas - Correio Braziliense, Jornal do Brasil, TV Globo e o Caderno de Livros de O Globo. Sua tese de doutorado está em processo de edição em livro, intitulado Câmera Clara - Tela Obscura: Estereótipos Femininos e Questões de Gênero nos Cinemas. 

Sábado, 22 de fevereiro de 2014 06:50 pm

Descanse em paz, caro Stuart!

Há alguma esperança...


 
O professor e pesquisador do multiculturalismo, Stuart Hall, morreu na semana passada, aos 82 anos. Ele formulou a teoria da codificação e decodificação – que analisa como aqueles que estão no poder (midiático, político e/ou econômico ) propagam mensagens por meio da cultura de massa/pop e como quem recebe tais mensagens as nterpretam. Foi também um dos principais fundadores da chamada Escola de Birmingham (Comunicação e Estudos Culturais). 


Não sei se Stuart Hall algum dia perdeu seu precioso tempo para repassar alguns vídeos ou cenas das “famosas” novelas brasileiras. Ou em boa parte dos filmes nacionais. Acredito que não. Nem precisaria. Bastaria um breve relato e já daria para saber o que vai aqui e ali, em todas essas produções. (Veja o artigo do Blog da Igualdade)

Ou seja, as equivocadas representações sociais, os estereótipos perversos que sempre funcionam contra as diversidades (principalmente, os que desqualificam e relegam as mulheres ao assujeitamento), e a manutenção do status quo , a todo custo, por meio da uniformização de ideologias e construtos socio-comportamentais.

Hall, um dos principais pensadores sobre isso tudo – questões (multi) culturais –, morreu na semana passada. Não vou dizer que ele ainda vai revirar-se em seu túmulo por muito tempo. Se fosse fazê-lo, não descansaria. Entretanto, deve ter falecido bem desiludido, pois são claros os sinais, em diversas partes do globo, de que alguns retrocessos sociais, culturais e comportamentais espalham-se como pragas em plantações.

O jamaicano Hall foi um professor e pesquisador brilhante, pioneiro no campo dos estudos culturais na Grã-Bretanha. Um dos fundadores da chamada Escola de  Birmingham (Comunicação e Estudos Culturais), ele argumentou que a cultura é,de fato, multicultural Não é alta ou baixa, boa ou má, ou preta ou branca, masuma convergência em constante transformação, que reverbera a diversidade daspessoas que a criam e consomem.

Em seus 82 anos de vida, Hall sofreu, literalmente na pele, o que as ditaduras raciais do patriarcado eurocêntrico podem fazer para destruir e fragmentar seres humanos, culturas e nações inteiras. No período pós-guerra, em 1950, quando o ainda adolescente Stuart chega para estudar em Oxford (Inglaterra), ganhador de uma bolsa de estudos, quase desiste de tudo, abalado.

À época, a Jamaica ainda era colônia britânica e ele era filho de mistura interracial, tendo compleição mais escura. Na escala da tal “pigmentocracia”, a variação da melanina determina quem tem mais chances de ascensão social. Em entrevista, já nos anos 2000, Hall contou sua experiência ao iniciar os estudos no que era, e ainda é, uma das mais sólidas e conceituadas universidades do mundo:

“O que eu me dei conta, no momento em que pisei em Oxford, é que eu não poderia fazer parte dela. Quero dizer, eu poderia fazer sucesso ali, poderia até ser aceito (como membro), mas eu jamais sentiria como se aquele fosse o meu lugar. É o cume de outra coisa. É anglicismo destilado.” ( Stuart Hall, Trailblazing British Scholar of Multicultural Influences, Is Dead at 82, The New York Times, 17/02/2014)

O ativismo e as pesquisas de Hall, a partir de sua chegada à Grã-Bretanha do pós-guerra, enveredaram-se para ecléticos e complexos temas, que iam da suavização da rígida estrutura de classes britânica, mas ao mesmo tempo do enfraquecimento de seu operariado; resvalaram no desarmamento nuclear; e passaram a abarcar as questões que envolvem os estudos culturais como um todo: televisão (produções audiovisuais), juventude, direitos civis, imigração, feminismo, diversidades raciais e étnicas.


 
Stuart Hall equipa e maneja a creche na primeira Conferência das Mulheres ocorrida no RuskinCollege, Oxford, em 1970. Foto da conferência feitas por Sally Fraser ( agora Chandan Fraser )

Em suma, Hall dedicou-se justamente às questões que estavam emergindo, ou ressurgindo, como problemas a serem estudados e trabalhados na contemporaneidade. Entre os anos 1950 e 1960, ele uniu esforços com outros pesquisadores como E. P. Thompson, Raymond Williams e Richard Hoggart, que terminaram por fundar o Centre for Contemporary Cultural Studies da Universidade de Birmingham.

Stuart Hall torna-se conhecido por desenvolver teoria que ele chamou de codificação/decodificação: a análise de como aqueles que estão no poder (midiático, político e/ou econômico ) propagam mensagens por meio da cultura de massa/pop, e como quem recebe tais mensagens as nterpretam.

Para ele, os estudos culturais são sobre poder e política, e sobre a compreensão das forças que formam e delineiam a manutenção do poder em suas diferentes esferas. “A questão racial é uma dessas forças. Raça é mais como uma linguagem do que a forma como nós somos biologicamente constituídos”, afirmou o pesquisador em uma palestra nos anos 1990.

Hall ressaltou a importância do estudo da(s) ideologia(s) para se compreender a estrutura social de poder, ao sustentar que o campo da   Comunicação Social seria produtor e reprodutor de ideologias, por maior que fosse a sua pretensão de “independência”.

Essa suposta isenção dos meios de comunicação de massa, dos produtores da indústria cultural – ficcional ou não-ficcional (jornais eletrônicos, digitais e impressos, por exemplo) –, já foi debatida e combalida, ao longo das últimas seis décadas. E é um conceito utópico, quando lidamos com as realidades que cercam nossas mídias, no Brasil e no mundo.

Hall e tantas e tantos outros envolvidos na pesquisa do multiculturalismo e do pos-colonialismo concordam que a linguagem é elemento preponderante na definição do ser humano, enquanto indivíduo e como ser social. Estudar a comunicação seria, então, pesquisar as relações entre as pessoas e o meio social e a própria sociedade.

A indústria cultural, nessa perspectiva, torna-se modeladora da consciência, capaz de configurar o conhecimento em conformidade com estruturas ideológicas que assegurariam a coesão social, a manutenção do status quo e a subsistência da dominação de uns (poucos) sobre outros (vários grupos sociais).

Aliás, o besteirol, os clichês e as frase feitas – aquelas que nos remetem à psicologia de botequim, trocada em tons de seriedade “profunda” após alguns goles – têm sido hegemônicos também no cinema e no teatro. Fazer o quê em um país onde a “cultura” (de e para as massas) é monopólio de um único conglomerado empresarial?  

Falar em homogeneização industrial da cultura no Brasil é pouco. Bobagem. O que ocorre aqui é uma dominação abusiva, absurda, de visão absolutamente monolítica e ditatorial sobre tudo o que se vê, ouve, compra, descarta, debate nas mesas de bares ou, hoje, nas redes sociais, em mensagens e discursos trocados digitalmente. As organizações Globo detêm um monopólio quase divino e difícil de se encontrar em qualquer outro país.

A dominação ideológica (que é também política e econômica) começa na criação, passa pela produção e pós, e invade todo e qualquer reduto, por mais remoto, por meio da soberania nos meios físicos e virtuais de distribuição e exibição. Caso das emissoras afiliadas e associadas (TV e Rádio, públicos ou por assinatura); dos portais G1 e da Globo (internet); da Globo Filmes (cinema); meios impressos, com jornais e revistas (também virtuais); produtoras e distribuidoras musicais; e os diversos projetos sociais, educativos e/ou culturais, que incluem shows musicais e peças teatrais.

Patético. Um país continental que não tem nem referenciais para dizer que gostaria de algo diferente. Ou exigir outras opções. Como? Com o que se vê, ouve e lê nos outros grupos-espelhos? Record? SBT? Band? Alguma outra chanchada?

Em entrevista que fiz há algum tempo para um jornal, ouvi de uma respeitada atriz “global” (teatro, cinema e TV) que ela jamais assistira (ou viria a perder tempo com) uma novela. Nem mesmo aquelas em que estava atuando. Para quê?

Descanse em paz, caro Stuart Hall! Você fez pupilas e pupilos, em todo o mundo. Até mesmo na pequena aldeia global brasileira. Obrigada!


Links relacionados:

A LW Books montou uma página eletrônica para Stuart Hall e reuniu vários dos textos escritos sobre e por ele, e também algumas fotos e videos:


Sobre a Escola de Birmingham e Stuart Hall:

“The Stuart Hall Project,” documentário de John Akomfrah, apresentado em 2013 no Sundance Film Festival .



Debate sobre mídia e responsabilidade social, ética e democracia participativa no TED Talks, com David Puttnam. Ele é educador e cineasta britânico, além de atuar na política (partido trabalhista inglês):


Sábado, 01 de fevereiro de 2014 05:18 pm

Ipanema solta balões para Sochi

Anistia Internacional organiza ato amanhã (2)


 
Revoada de balões “Para a Rússia, com Amor”: Para chamar a atenção de vários países sobre as violações dos direitos humanos e civis dos LGBTIQ, a Anistia Internacional promove uma manifestação amanhã, domingo (2), na praia de Ipanema (RJ). Balões coloridos serão distribuídos aos banhistas entre os postos 8 e 9 (próximo à rua Farme de Amoedo), que espalharão a mensagem “Amar é um Direito Humano”. Às 16h30, 500 balões serão soltos ao mesmo tempo pelos céus do Rio, com mensagens contra a homofobia e em defesa dos direitos de LGBTIs. Os balões são produzidos com material biodegradável, informa a AI. 
Algo bem mais sério do que beijo de novela (medíocre) brasileira está no ar. Por aqui e mundo afora. E as lanternas vermelhas estão acesas entre os LGBTIQA! Ah, deixa eu explicar essa sigla, antes de mais nada: algumas ONGs, escolas, universidades e associações que trabalham com e pelos direitos humanos e civis das comunidades lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros têm acrescentado outros grupos à sopa de letrinhas – as pessoas intersexuais, as queer e/ou as quequestionam suas identidades sexuais, e as aliadas.

Vamos lá. Nada menos que 100 mil militares, policiais e agentes de inteligência vigiarão os Jogos Olímpicos de Inverno, em Sochi (Rússia), que começam dia 7 e terminam em 23 de fevereiro. Tudo parece ser perigoso nessa Olimpíada de Inverno, que deveria ser um evento esportivo pacífico. Uma disputa saudável para mostrar espetáculos de destreza, beleza e dos limites humanos. Entre as ameaças, algumas graves nas infindáveis ações de extremistas, em disputas territoriais, étnicas e/ou religiosas.

Outros temores das autoridades russas são esses “perigosos” grupos LGBTIQA e seus manifestantes aliados! Sim, são ameaçadores, de acordo com os políticos, religiosos ortodoxos (ou fundamentalistas) e as leis que entraram em vigor recentemente, naquele país, contra a exposição pública do afeto e das relações amorosas gays.

parlamento russo aprovou em 2013, por unanimidade e sob pressão do presidente Vladimir Putin, a legislação que proíbe a propaganda de “relações amorosas e sexuais não-tradicionais” em locais acessíveis a menores. Essencialmente, ela criminaliza qualquer imagem ou representação positiva ou a discussão das identidades não heterossexuais. E fundamentalistas como o ator Ivan Okhlobystin, um excomungado sacerdote do cristianismo ortodoxo, pediu ao governo para restabelecer outra lei da antiga União Soviética que pune os LGBT com a prisão sumária.

Assim como o Congresso brasileiro enterrou, em dezembro passado, o texto original do PLC 122/2006, debatido na Comissão de Direitos Humanos do Senado,que previa a tipificação do crime de homofobia. Também introduziria os termos “gênero”, “identidade de gênero”, “identidade ou orientação sexual” no novo Código Penal e nos parágrafos relativos ao preconceito. Reacionarismos “anti-gays”, aliás, estão avançando em vários países da África, da Europa e das Américas. (veja o artigo aqui no Blog)

Então, às vésperas da abertura das Olimpíadas de Sochi, o mundo está bem atento ao que vai ocorrer na Rússia. A Anistia Internacional, por meio de nota, afirma que os olhares devem ter foco nas graves violações dos direitos humanos promovidas pelo governo daquele país. A organização internacional promove a campanha “Para a Rússia, com Amor” e encaminhará uma petição – com a mensagem “Amar é um Direito Humano” – para o presidente Putin.

“A violência contra os grupos LGBTI, as severas limitações às liberdades de reunião e de expressão e a criminalização dos movimentos pelos direitos humanos são apenas algumas das arbitrariedades cometidas na Rússia, desde que o presidente Vladimir Putin voltou a governar”, atesta a Anistia Internacional. A exemplo do que tem feito em outros países, a organização recolherá assinaturas de apoio à petição que encaminhará às autoridades russas. O evento ocorre amanhã (2) na praia de Ipanema (Rio), entre os postos 8 e 9, a partir das 14h.


  
O cartaz traz a imagem de uma travesti, um transexual masculino e uma transexual feminina, com a mensagem “Nem rótulos nem preconceito. Quero respeito”. É nesse âmbito que se fundamenta a incorporação, na agenda política do CFESS-CRESS, do Dia Nacional da Visibilidade Trans: o respeito à diversidade humana, em sintonia com a campanha Toda violação de direitos é violência , cujo slogan é Sem movimento não há liberdade Arte: Rafael Werkema/foto: Bruno Costa e Silva/Editacuja

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