quinta-feira, 19 de junho de 2014

Liberdade de expressão e a Copa do Mundo: Eu posso xingar a Presidenta?

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 - Liberdade de expressão e a Copa do Mundo: Eu posso xingar a Presidenta?
Por Brunno Pandori Giancoli
Advogado. Professor de Direito Civil e Direito do Consumidor do Damásio Educacional. Secretário-Geral da Comissão de Direito do Consumidor da OAB/SP

Começou a Copa do Mundo. Todos sentados esperando o início do jogo. Começa o espetáculo de abertura e as manifestações da torcida. Entre gritos e palmas surge um sonoro e cadenciado "Dilma vai..."(a educação não me permite completar a frase). Nesse momento muitos devem ter pensado "ela merece!!!", "É Copa!!! As pessoas podem se manifestar do jeito que quiserem". Mas será que podem? Ofender a Presidenta da República é uma forma legítima de liberdade de expressão?
Políticos e personalidades públicas, gostando ou não da ideia, desde os tempos mais remotos, são obrigadas a conviver com atos de desaprovação e repúdio. Um exemplo conhecido é a vaia ou apupo. Ela surge como uma demonstração pública por alguém ou por alguma coisa, em geram com a interjeição "buu!" num coro prolongado. Historiadores afirmam que o ato de vaiar (e também o de aplaudir) surgiu na Grécia Antiga em razão das execuções de criminosos e traidores do Estado, para demonstrar aprovação ou não à condenação.
No Brasil, ato de vaiar tornou-se uma prática comum em eventos esportivos - a exemplo da Copa do Mundo - para demonstrar a insatisfação pública com Prefeitos, Governadores e até mesmo com Presidentes (e Presidentas). O ato de vaiar até pode ser considerado grosseiro, mas representa uma expressão milenar do exercício da liberdade de expressão, previsto expressamente no art. 5o, IX da CF/88, bem como no "Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos", cujo art. 19 estabelece que ninguém poderá ser molestado por suas opiniões, incluindo a liberdade de procurar, receber e difundir informações e ideias de qualquer natureza, independentemente de considerações de fronteiras, verbalmente ou por escrito, em forma impressa ou artística.
A vaia, portanto, traduz um direito impregnado de qualificação constitucional, plenamente oponível aos que exercem qualquer atividade de interesse coletivo. O ato de vaiar, visto como crítica social, sobrepõe-se a eventuais suscetibilidades que possam revelar as pessoas públicas ou as figuras notórias, exercentes, ou não, de cargos oficiais. A vaia, por mais grosseira e veemente que possa ser, deixa de sofrer, quanto ao seu concreto exercício, as limitações externas que ordinariamente resultam dos direitos de personalidade. Mas esta ideia também é aplicável aos xingamentos? Ou estamos diante de um abuso do exercício da liberdade de expressão?
O próprio art. 19 do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos afirma no § 2º que a liberdade de expressão poderá estar sujeito a certas restrições, justamente para assegurar o respeito dos direitos e da reputação das pessoas e assegurar a moral pública. Esta norma claramente estabelece que os xingamentos, mesmo quando dirigidos as pessoas exercentes de cargo públicos, permite a configuração de dano moral indenizável. O tema, inclusive, já foi objeto de julgamento no Superior Tribunal de Justiça. No REsp REsp 1328914/DF, da relatoria da Ministra Nancy Andrigui, julgado em 11/03/2014, a Corte decidiu que "em se tratando de questões políticas, e de pessoa pública, como o é um Senador da República, é natural que haja exposição à opinião e crítica dos cidadãos, da imprensa. Contudo, não há como se tolerar que essa crítica desvie para ofensas pessoais. O exercício da crítica, bem como o direito à liberdade de expressão, não pode ser usado como pretexto para atos irresponsáveis, como os xingamentos, porque isso pode implicar mácula de difícil reparação à imagem de outras pessoas - o que é agravado para aquelas que têm pretensões políticas, que, para terem sucesso nas urnas, dependem da boa imagem pública perante seus eleitores".
A Copa do Mundo não é um salvo-conduto para as pessoas agirem de maneira irresponsável. Se os Brasileiros não gostam da atual gestão do Governo da Presidenta Dilma, todos têm assegurado o direito à crítica. Mas não vamos esquecer, antes de mais nada, que ela é a nossa representante maior e também uma senhora. Daí porque faço minhas as palavras de Hugo Schlesinger "só com respeito pode-se exigir respeito.?É uma regra sem exceções".

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